quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Sobre o dia em que vi Deus


Era dia. O sol estava a pino. A claridade mal me deixava enxergar o que fosse e as longas horas ali sem alimento nem água ofuscavam ainda mais a minha já tão gasta vista. Estava jogada a um quanto de parede carcomida. Meu corpo, dilacerado, parecia inerte não fosse minha respiração já fraca. Eu sangrava e não existia remédio para o meu mal. Meu mal estado físico não conseguia representar a farsa do meu estado psicológico.
Vi um verme se aproximar da ferida aberta e putrefata de um de meus membros. Afastei minha perna. Olhei o verme e, com um sorriso nos lábios, disse-lhe:
- Agora não, meu caro.
Não sei se o verme riu de mim, mas se não o fez, tinha tudo para fazê-lo. Eu responderia se fosse ele... Devaneei sobre o verme e nossa condição, mas logo apareceu um homem alto, robusto, para me atrapalhar as ideias.
Chegou sem dizer nada e foi logo batendo nas minhas pernas com a ponta da bota, jogando-as de um lado a outro. Olhei-o. Ele estalou a língua no palato, cuspiu e põe-se a entalhar um pedaço de madeira que levava consigo. Usava um sombreiro, o que não me deixou observar sua face, se mudara de fisionomia ao perceber que eu ainda estava viva.
Por um momento, pareceu observar todas as minhas feridas, mas eu não sei bem se o fez ou não. Enfiou a mão em um dos bolsos, tirou um escapulário com a imagem de São Miguel Arcanjo e o jogou sobre mim. Em seguida, retirou do cós da calça dois revólveres: um da frente, outro das costas. Estes últimos, depositou cuidadosamente sobre meu abdômen. Pegou minhas mãos e as colocou sobre as armas. Depois pôs o escapulário de pano em meu pescoço.
Eu não me mexia nem dizia nada, só o observava. Ele acendeu um cigarro, agachou-se, soprou a fumaça em meu rosto. Falou-me com tom grave:
- O escapulário é santo. Você, não! Empunhe as armas e siga em frente. Da próxima vez que cair, faça o mesmo. Não posso estar sempre pronto para acudir você.
Tragou mais uma vez o cigarro, levantou-se e saiu.
Desde então, sempre que caio, levanto-me sozinha e de armas e escapulário em punho... Ah, meu caro leitor, nunca mais vi Deus depois disso.

8 comentários:

Paulo Marmota disse...

Muito bom!

Thiago Lira disse...

foda! de onde é o texto, seu mesmo? =}

Lyla, a louca disse...

O texto é meu. Eu juro. Não subestimem uma mente vazia!

blablabla disse...

qué o quê?! mente vazia p/ rotina., essa menina é uma artista~~ ô imaginação fértil! gostei do texto! numa hora eu pensei q deus ia bater na bota e o 'indivíduo' iria acordar;. Pô mãe! na hora q eu ia ver se deus tinha olho azul?! kkkkkkkk

mo.rafaella@gmail.com disse...

Lyla, nossa, acho que se deus me desse um escapulario e uma arma, no estado em que você seencontrava, ou em qualquer outro estado: eu atiraria nele e colocaria o escapulario entorno de seu pesscoço e diria: vai, agora levanta você de novo, porque você se diz santo.
Mas enfim, aí esta seria a minha história, o meu acerto de contas com deus...
A sua história é perfeita! Beijos Parabens!!!

Unknown disse...

Eu diria que esse texto revela uma visão pessoal do eu-lirico.Uma especie de reveleção sublimada. Perdida e complexa, escondida em cada palavra da estrutura poética. Lylinha, em outras palavras, este texto revela-ti como sois...bjs

Anônimo disse...

Yo Marília-chan o/
Tava há tempos vendo a sua propaganda do textim sobre Deus no msn e resolvi conferir. Nossa, gostei da sua versão de Deus, me lembrou um personagem de faroeste XD
Isso poderia dar um livro...

mo.rafaella@gmail.com disse...

Lylaaaa!!!
Visita esse blog: http://galafuz.blogspot.com/ , é de um amigo meu. ele escreve muuuuuito também! Acho que vc vai gostar!
Beijoes!