sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Oublier


Esqueça por uma noite tudo aquilo pelo qual passamos
As discussões, as brigas, as palavras duras que lançamos um ao outro
Esqueça e veja o céu como está, assim como no dia em que nos beijamos

Esqueça por uma noite que nossas tristezas foram maiores que nossas alegrias
Esqueça o que ensaiamos viver e não vivemos
Esqueça nossos planos, nossos futuros sorrisos
Esqueça, meu amor, esqueça.

Esqueça por uma noite a forma como eu cruzei aquela porta
Esqueça tudo o que eu falei e o que eles falaram também
Esqueça e me conceda esta dança...

Assim, eu segurando tua mão com minha mão
E tua escápula com a outra
Dançamos e eu não pude deixar de levar minha cabeça ao teu peito e me perguntar:

Por que você achou que não viriam me advertir?
Que não viriam me falar e dar suas opiniões?
Ou pior, que eu não descobriria sozinha?
Por que você me fez passar por tudo o que eu passei?
Por toda aquela humilhação... Por quê?

Esqueça, meu amor, afinal não poderei esquecer
Que essa será nossa última dança.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

O desencanto


Nosso terceiro encontro... Tava vidrado naquela mina. Rostinho angelical, toda fina, cheia das educação. Eu pensei até que ela fosse metida a besta, mas a menina era gente fina.
Falava de tudo. Falou de samba, de rock, de futebol, até riu quando eu lembrei da musiquinha do Mario Bros. Falava baixo, prestava atenção em tudo que eu falava, era inteligente. Não olhou nenhum cara do bar, como essas menina louca que eu tava acostumado. Agradecia o garçom toda vez que ele vinha na mesa. Tinha um lero legal, uma carinha de virgem do cacete, dessas que sabem o evangelho de cor e salteado, saca?
Na primeira vez que a gente saiu foi pra um desses boteco seboso. Ela pediu pra dividir a conta e eu, malandro que sou, saquei o esquema: quando a mulher quer pagar tua conta, nêgo, é pra não ter a responsabilidade de dar pra tu.
Dessa vez, levei no melhor bar que eu conhecia e quando a conta chegou, eu fiz questão de pagar tudinho, centavo por centavo.
Quando a gente foi pra um canto escondidinho (um motelzinho de responsa, que a mina valia a pena), olhei o rostinho dela, ela toda timidazinha... Bróder, deu pena, véi. Queria levar ela pra casa, apresentar pra minha mãe, casar, ter filho, tudo assim bonitinho que nem ela.
Mas na hora do vamo que vamo, veio a decepção:
Tão perfeita e trepava feito atriz pornô.
Desencantei.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

O carnaval da louca


Me chamaram de louca
Me jogaram ao chacal
E com a voz tão rouca
Desejaram o meu mal

Me chamaram decadente
Me disseram atrevida
Me joguei à própria sorte
Me entreguei a minha vida

Me chamaram de doente
Me disseram que não
Hoje vêm assim contentes
Querendo me dar a mão

Me chamaram deprimida
Me negaram os braços
Hoje vêm tão displicentes
Querendo me dar abraços

Me chamaram pessimista
Não quiseram me dar teto
Como se ser otimista
fosse não ter desafeto

Mas não me entenda faz mal
Cada um dos meus dias
É dia de carnaval
E todas as minhas dores
são pretextos pra sambar.
Hoje o bloco é seleto
Se negaram me teto
Não será mais um motivo para chorar
Vou até fazer direito
vou inflar bem forte o peito
Pra duas coisas não faltar:
Amor e ar!

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

O caderno vermelho



Mariana ganhou de presente de natal da sua avó um caderninho vermelho de poucas páginas quando tinha apenas 13 anos:
- É para guardar as lembranças de seus amores – disse a vó.
Como o amor não vinha, decidiu aos 17 narrar suas aventuras no caderninho. A primeira estava lá, com o nome gravado com todo o carinho que suas mãos podiam dar. Não sabia se era bem amor, mas como o tempo passava e o caderninho estava ainda em branco, descobriu o amor nos braços daquele mesmo. E eis o primeiro nome...
Quando anos depois descobriu a traição do amado, rasgou todas as folhas e juras de amor daquele caderninho vermelho. Chorou durante dias, é certo. Quem já chorou dessas dores, não há de duvidar. Mas como o amor se foi, as lágrimas foram junto. Mas se demorou tanto a ir...
Pois que um dia, Mariana entra numa livraria sem grandes pretensões. Queria algo para acalmar o pensamento. Deu de cara com um livro que o vendedor louvara e lançara ao vento elogios mil ao autor.
- Soube que até foi Nobel em literatura?
Era “O amor nos tempos do Cólera” de Gabriel Garcia Marquez. Levou-o. Não porque achou que seria bom, mas pelos louvores do vendedor, não podia ser má obra.
Leu-o. E viu que, quando fora abandonado por Fermina, Florentino escreveu num caderno todas as mulheres com as quais fizera amor.
- Farei o mesmo. E terei mais que ele! – pensou e em seguida correu por todas as livrarias e papelarias da cidade para comprar um caderno de capa vermelha, dessa vez com muitas, inúmeras páginas. Achou-o. Não era lá tão grande. Era um caderno comum. Pegou uma caneta e escreveu:
“Número 1. O canalha – nada de relevante a comentar. Ainda não sei diferenciá-lo dos outros”
Depois correu até outra livraria e pôs-se a conversar com o vendedor que lhe vendera o livro elogiando a escolha e dizendo tudo que achara interessante na narrativa. Mais tarde, o vendedor se tornaria o número 2.
“Número 2. O vendedor de livros – muito rápido. Só”.
Depois o número 3 “O amigo que sempre quis me comer”, o quarto “o bibliotecário bonitinho”, o quinto “Meu professor de Literatura”, o sexto “o vizinho”... e assim foi lotando o caderninho até chegar à ultima página. Correu à livraria, precisava de mais folhas para escrever o resto.
- Tenho mais homens que Florentino Ariza teve mulheres!”– orgulhava-se a andar pelas ruas com o caderninho nos braços. Ao entrar na livraria teve um sobressalto. O “canalha” estava com sua nova namorada. Mariana quase deixou o caderninho cair das mãos. Deu as costas e folheou o caderno.
- Tantos homens por isso? Por esse espécime rebaixado? – pensou consigo.
Uma atendente veio perguntar-lhe se poderia ajudar. Ela respondeu:
- Não, não precisa. Não quero nada.
E saiu a rir de si mesma e a olhar o caderno.
Assim como Fermina Daza, iludiu-se pela imagem de seu Florentino Ariza quando com olhos jovens e inebriados de paixão. Uma deusa coroada na feira do Porto, seu caderninho e um nada! Isso é que dá ficar lendo romances!

terça-feira, 4 de outubro de 2011

3 anos do "Fala, Lyla Louca"


3 anos, mas parece que foi ontem que eu fiz minha primeira (de muitas) postagem aqui.
O blog variou, falou de música, de livros, de filmes. Teve poemas, pequenos contos, desabafos, histórias inventadas e outras reais com pinceladas de poesia, de melancolia, de eufemismos...
A quem o leu, meu muito obrigada!
Agradeço por você fazer parte deste momento.

Um forte abraço,

Lyla.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Persépolis


Dividida em quatro livros, a graphic novel autobiográfica Persépolis é um achado. Neles, a iraniana Marjane Satrapi conta sua infância, adolescência e início da adultez durante a revolução islâmica e também durante a guerra do Irã-Iraque, entre os anos de 1980 e 1988.
Satrapi nos narra as angústias de uma guerra, da falta de liberdade de expressão em um Irã dominado pelas fundamentalistas; da aflição de ser imigrante na Áustria e se sentir imigrante em seu próprio país.
Nascida numa família moderna, politizada e laica, Satrapi mostra com bom humor (e umas pitadas de inevitável drama) sua vida de rebeldia e transgressão, mas também de medo, solidão e desesperança.
Por mais distante que seja a realidade iraniana da época de nossa realidade, ainda é possível se identificar com as palavras de Satrapi, com suas indagações sobre sua própria identidade e de seus valores morais típicas de muitas fases de nossas vidas.
Persépolis merece ser lido e não apenas por falar de liberdade, por ter lindas e expressivas ilustrações em preto e branco e lidar com humor com uma temática tão difícil como a guerra, mas também por lidar com elementos constitutivos da própria condição humana.
O Irã nem nos parece mais tão distante e o livro torna-se universal.
Vale a pena dar uma conferida.

*Não assisti a adaptação para o cinema dirigida pela própria autora. O filme foi indicado ao Oscar de melhor animação em 2007.