terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Notas de uma iniciante na caridade


Era mês de natal. Tive a feliz idéia de fazer meu primeiro gesto filantrópico. Entrei em uma comunidade do orkut, da qual sou membro, e dei a idéia: ser o Papai Noel de uma criança carente.
Como a comunidade já ajudava uma creche, não tive problemas e tudo correu muito bem. Os presentes foram conseguidos prontamente e chegou o dia da entrega.
Decidi não ir. Natal, para mim, é uma época melancólica, na qual eu também fico melancólica. Não sou boa companhia para ninguém nessa época, que dirá de uma criança de 3 anos com sua vivacidade e espontaneidade.
Temi, não escondo. Tive medo que ela não gostasse de mim. Ou que demonstrasse não ter gostado do presente. Que me negasse o afago de meus braços. Tive medo e quanto ao medo é só.
Sempre vi a filantropia como algo que se faz pensando, muitas vezes, única e exclusivamente em si. Nada mais egoísta do que aquele sentimento ridículo de um feito imenso quando só se fez NADA. A espera idiota de reconhecimento, de louvores públicos, de sensações ligadas a um bem-estar de um ser caridoso. Nada mais egoísta que tudo isso. Frívolo!
Poupei-me disso. Não entreguei em mãos o brinquedo a fim de não passar pelo que eu não queria: a futilidade da beneficência. Dei-o a uma amiga que deve tê-lo feito bem, bem melhor do que eu faria. Não era vontade de agora, era já de algum tempo. Lembro até que ao dizer a uma amiga que não iria entregar o presente, esta me perguntou: “Tu não tem coração mesmo, não é?”. Eu achei graça. Pensei que falasse brincando... Brincava?
Não sei se fiz bem. Não pensei ainda de outra forma para contrapô-las e pensar no que era melhor ter feito.
Talvez ela me recebesse bem. Talvez fizesse aquele gesto infantil de acanhamento. Mas nem um belo e bom sorriso de criança fez com que eu mudasse o rumo de meus pensamentos. Abstive-me de sentimentos que eu julgava baixos. Não iria me aproveitar de uma criança.
No entanto, espero que ela tenha gostado e que se divirta muito com meu presente.
Abstive-me do orgulho de presentear. Ter orgulho do presente tira dele, no mínimo, metade da sua áurea mágica original.

domingo, 21 de dezembro de 2008

É tempo de Natal


É Natal. É tempo de amigo secreto, especiais de tv, festa em família, luzinhas piscando para todas as partes e de produtos caros quando você mais precisa deles. É tempo de confraternização, de encher a cara, de pensar no ano que está para vir.
Natal é um período estranho. Completamente estranho. É um misto de melancolia e euforia. De amor e falsidade. De esperança e desilusão.
A beleza que encanta uns, entristece outros. É da dialética da própria vida. As luzinhas piscando freneticamente enquanto você caminha devagar. Não consigo descrever o que se sente nem o que se pensa nessas horas de melodias alegremente tristes.
Estamos comemorando o nascimento de Cristo enchendo as lojas. E muitos nem têm consciência de que o Natal é uma festa religiosa. No Natal pensamos na nossa ceia e, vez ou outra, pensamos em quem não tem o que comer. E se pensar nisso não entristece você, meu caro, você não sabe o que é o “espírito natalino”. È um pensar em si, lembrar do outro e voltar a si. É uma comoção egoísta.
No entanto, coma bem, comemore, confraternize. Tenha um ótimo natal. E se estiver melancólico pela data, não se preocupe, ela há de passar logo.
Boas Festas!

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Nostalgia?



Tenho percebido ultimamente que as pessoas a minha volta andam bem nostálgicas. Relembrando o passado, querendo que o tempo volte atrás, querendo viver uma época que não viveu, ser criança outra vez... Sentir saudades é compreensível (eu morro de saudades, por exemplo, de jogar fliperama, comer macarrão doce e do cheirinho da boneca Moranguinho da minha irmã) e é claro que muita coisa mudou no mundo, eu sei, mas daí acreditar que tudo no passado era perfeito é uma grande balela!
É um fato. As pessoas eram igualmente cruéis, alguns políticos eram igualmente corruptos, as pessoas matavam como hoje, havia exploração, desigualdade social, padrões de beleza...
Sim, até concordo que hoje há bombas atômicas e a possibilidade de voarmos pelos ares a qualquer instante, alimentos transgênicos, aquecimento global, novas doenças... Mas hoje as mulheres votam, exercem a cidadania votando em um idiota qualquer que irá f* suas vidas. Mas podem ESCOLHER quem será esse idiota. Ah, la vie en rose!
Muitas vezes me pego pensando se eu não queria voltar alguns anos no tempo e ser, sei lá, uma menina de 15 anos outra vez. Obvio que não! Eu não podia passar a noite fora, não tinha dinheiro para sair se não pedisse aos meus pais, não entrava em muitas casas de show por causa da idade, não podia comprar bebidas, era um ser manipulado (ainda sou, mas gosto de ter a ilusão que não) pela mídia, invejava a porcaria de um all star, achava-me (ainda acho, mas nem tanto) o ser mais feio sobre a face da Terra, não tinha a experiência de vida que tenho hoje, era obrigada a estudar química, física, biologia...
Definitivamente, não! Prefiro minha idade, meu tempo agora. Isso de sentir saudade de polainas é um saco! É negar toda uma vida, todos os erros, acertos. É ter medo de encarar o futuro. É não aceitar que toda idade tem sua beleza, sua liberdade, sua responsabilidade. É negar viver. É se negar.
Revival do passado só se for em festas em comemoração ao presente. Aí visto minhas polainas, meu prendedor de cabelo à la Cindy Lauper, minha bota da Xuxa, minha blusa da She-ra... Ai, ai, que saudades... SAUDADES, não vontade de voltar aos anos 80. Deus me livre e guarde!

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Intelectualóidismo


Doença antes rara, o intelectualóidismo assola todo o mundo. Altamente contagiosa, essa doença se espalha a passos gigantescos. Infelizmente ainda não possui cura.
Eu poderia informá-lo, caro leitor, que esta doença não mata, mas não quero deixá-lo com a imagem errônea de que ela não pode fazer muito mal. Um dos principais sintomas é que o paciente passa a se gabar por tudo que lê. Depois, começa a se gabar de tudo que ouve. Depois, dos filmes que vê. Por último, passa a agir como se fosse superior aos que não fazem o que ele faz (ler, ver e ouvir coisas julgadas boas, canônicas).
Preconceitos a parte, não suporto o tipo! Por que se gabar pelo que lê? Até concordo que ler produz conhecimento que, por sua vez, produz poder. Mas esse poder pode ser passado de mão em mão. Ler não o faz melhor que ninguém. Não se orgulhe de ler Dostoievski, Machado de Assis... Isso qualquer alfabetizado faz. Eu me orgulharia se tivesse escrito as obras e não de tê-las lido. Ler é fácil. Interpretar é que é difícil. E conhecimento por conhecimento a gente acha no google!
Não é o que você sabe, mas o que faz com o que sabe (Deus do céu, de onde tirei isso?).
O intelectualóide, também conhecido como pseudo-intelectual, muitas vezes pode fingir amar filmes do tipo cabeçudos que ninguém entende (aqueles sem pé nem cabeça, sabe?) e álbuns conceituais (salvo raras exceções)... O gosto musical é refinado e por isso se julga o melhor ser que já pisou sobre a terra (não só se julga como as pessoas comuns também ajudam na deformação da auto-imagem desse indivíduo – Vide google: Mallu Magalhães) Um saco!
Mães, por favor, não se preocupem se seus filhos possuem gostos estranhos (leia-se bom gosto), mas atentem para comportamentos presunçosos.
E, se você possui um desses sintomas (clique na imagem acima e descubra), procure ajuda urgentemente ou, pelo amor do Santo Sócrates, afaste-se de mim!

domingo, 2 de novembro de 2008

Tudo o que quero agora


Há alguns dias comecei a ter a estranha impressão de ter recebido pouco. Esmolas de atenção, afeto, migalhas de amor.
Não sei bem se só recebi o que merecia ou se recebi mais do que devia. Talvez eu também tenha dado tudo em pequenas porções.
Mas hoje penso que merecendo ou não, quero tudo em porções grandes. Chega de doses homeopáticas. Quero ter uma overdose depois de tanto tempo em abstinência.
Eu quero amor em doses cavalares. Eu quero amizades intensas, fiéis, leais. Quero viver sem consciência. Quero errar até que o erro vire acerto ou que não me reste outra opção a não ser consertá-lo.
Não desejo mais calma, serenidade, tranqüilidade. Eu quero é euforia. Eu quero me sentir viva desde a hora em que acordo até a hora que vou dormir. Não me preocupar mais com o que pensam sobre mim, nem com o que eu penso. Não voltar a analisar o quanto sou boa, passiva, amiga, se sou uma lady... Eu não quero ser boa nem ir com a cara de todo mundo. Eu quero é ser torta! Eu quero ser gauche!
Eu quero tudo aos montes, em quantidades que eu não consiga segurar com as mãos. Amores de abismo, de desespero de tanto amor.
Desejo mais e sempre mais ainda que eu não mereça. Nem sempre a gente pensa se merece tudo que tem.
Mas eu sei que eu daria de volta tudo aquilo em doses nas quais eu pensasse estar recebendo.
Agora que vejo estar terminando este texto, vem-me à mente a seguinte questão: será que eu já não recebo isso tudo, mas sou ingrata demais para reconhecer?
Se assim for, mudem tudo o que eu disse: Eu quero SENTIR que recebo tudo isso. Não adianta ter aquilo do qual você não se sente dono.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Ateísta graças a Deus


O filósofo inglês Bertrand Russel explicou em Por que não sou cristão os motivos que o levaram a não ser um seguidor da doutrina de Cristo. Eu, no entanto, não escreveria um livro sobre o tema por vários motivos. O primeiro deles é por não possuir talento o suficiente. Os outros são, quase que em sua totalidade, decorrentes do primeiro.
Eu não sou cristã. Eu não acredito em Deus, e acreditar que ele existe é pré-requisito básico para qualquer cristão. No entanto, não saio por aí aos quatro ventos gritando que ele não existe ou que os que crêem em sua existência são pobres alienados. Ser o que as pessoas chamam de ateísta não é motivo de orgulho (muito menos de vergonha) para mim. É apenas uma questão de crença ou quem sabe até de formação.
O que verdadeiramente me incomoda são as caras feias que fazem para mim todas as vezes que eu confesso meu ateísmo. Parece que tenho uma doença rara e que alguém tem o poder de curar imediatamente com versículos da Bíblia. E é nesse momento de “salvação” que eles me perguntam: “Nossa, mas você não acredita em nada? Deve ser muito ruim...” O que respondo? Na maioria das vezes eu deixo para lá. Nem sempre vale muito a pena responder qualquer coisa...
Acredito em inúmeras coisas e em outras, nem tanto. Mas no meu pequeno baú de coisas para crer ou não, Deus é uma interrogação enorme. Não posso garantir a ninguém, nem a mim mesma, que ele não existe. Mas eu acho muito pouco provável e tenho os meus motivos para pensar dessa forma. E se pensar assim pode me levar ao inferno, espero que antes que me lancem às chamas eternas me expliquem ao menos porque Deus existia e fez com que tantos homens duvidassem.
Então peço este enorme favor: Não tentem me converter. Além de ser uma tarefa inglória, na qual nós dois perderemos nosso precioso tempo, pode fazer com que eu pense que você não respeita minha crença (ou descrença, sei lá). Mas aos que não conseguirem evitar tentar me salvar da danação eterna, venham, ao menos, com bons argumentos para que possamos desfrutar de uma boa discussão. Mas cuidado! Até hoje ninguém me apresentou sequer um argumento que se sustentasse.

domingo, 5 de outubro de 2008

É mentira!!!


“Todo mundo mente, só variam os motivos”, já diz o famoso médico infectologista viciado em Vicodin que, por mais sisudo e mal-humorado que pareça, nos faz ficar vidrados na telinha toda vez que ele aparece. Mas o Dr. House estaria certo? Cada vez mais estamos certos que sim.
Um simples “sim, seu cabelo está lindo” dito para uma amiga que acabou de cortá-los e você acha que ficou um horror é sim uma mentira, por mais que você bata o pezinho e diga compulsivamente que não.
Você nunca chegou atrasado no trabalho e disse que aconteceu um milhão de coisas que o atrasaram, quando na verdade você só queria dormir um pouco mais depois daquela festinha?
Bem, se você acha que não mente, bem vindo ao mundo dos “sem vida ou círculo social”. Nossa sociedade foi construída sobre as bases da mentira. Sem ela, nossa sociedade não se manteria de pé (ou capenga como é hoje). Se pensarmos bem, pode ser que a primeira mentira dita sobre este mundo tenha vindo de Adão quando este disse a Deus que a culpa era de Eva. Ou mesmo toda a história de Adão e Eva seja mentira! Já contaram milhares de mentiras pra você desde a mais inocente, como quando sua mãe falou pra você que os bebês eram trazidos pelas cegonhas, até as mais duras e dolorosas, como aquela sua ex-namorada que produzia urros inexplicáveis que você tanto adorava e o fazia se sentir o melhor de sua espécie, podia estar na verdade apenas fingindo para fazer você feliz. É, a vida é dura e precisamos da mentira para sermos felizes. Uma mentirinha aqui ou uma mentira catastrófica ali, é ainda uma mentira.
Proponho que todos experimentem por um dia (um dia apenas, pelo amor de Deus) falar a verdade para todas as pessoas que você conhece. Não as esconda nada. Fale o que você pensa sobre o nariz delas, seu modo de se vestir, sua personalidade, suas coisinhas e manias irritantes. Conte tudo o que você odeia nelas, ou que você gostaria de mudar se pudesse.
Muitos dos que leram isso jamais vão fazê-lo. Podem até não concordar com o fato de que todos mentem, mas certamente não querem comprovar suas teses.
Uma pesquisa americana diz que uma pessoa com vida social movimentada chega a mentir inacreditáveis 200 vezes por dia!
Minta! Preserve sua vida social, seu emprego, sua família. Mentir é saudável. Ou minta e diga que nunca irá mentir na vida, a escolha é sua.

Belo para quem?


O que é belo? O que não é belo? Mulheres bonitas são bonitas por quê? E qual é o padrão de beleza a ser seguido?


Que a mídia nos impõe padrões inatingíveis todas sabemos, mas até onde isso vai? Li uma nota certa vez que dizia que a culpa pelos altos níveis de anorexia no mundo da moda era dos estilistas homossexuais que veriam nas modelos uma espécie de “boneca Barbie” que não tiveram na infância. Eu, particularmente, achei o texto muito mais homofóbico que consciente.


Há alguns meses atrás, o megastar Bono Vox fez uma piadinha infame com Nicole Richie, modelo anoréxica, dizendo que faria uma canção para arrecadar fundos para alimentá-la. Tudo bem que o mesmo tenha afirmado que a “piadinha” teria sido feita para a mídia em geral que, segundo ele, preocupa-se mais com a vida particular das celebridades que com os problemas mundiais. Mas a obsessão excessiva pela “beleza” não seria também um problema mundial que não devia ser alvo de tais piadas?


A menina de 9 anos que quer ser loira, a de 11 que se acha gorda, a de 13 que se acha feia, a de 15 que acha que precisa de silicone. Meninas que têm a falsa idéia de que ser “rebelde” é ter IMC (índice de massa corpórea) abaixo de 18, ter um corpo esquelético e cabelo liso... Não sei, mas isso me preocupa. Não mais que as questões da fome, das guerras e de tantas outras questões, mas me preocupa. Eu me inquieto ao saber de Anas e Myas.


Um estudo realizado com 3000 mulheres de 10 países revelou dados surpreendentes. Feito pela Dra. Nancy Etcoff (Universidade de Havard) e pela Dra. Susie Orbach (Escola de Economia de Londres) a pedido da DOVE , uma das maiores marcas de produtos de beleza do mundo, o estudo mostrou que 50 % das mulheres afirmam estar acima do seu peso ideal, 75% delas consideram sua beleza mediana e apenas 2% se consideram bonitas. Esse último índice é maior no Brasil (6%), o maior percentual de todos os países onde o estudo foi realizado, o que não deixa de surpreender, já que a famigerada mídia brasileira é cruel nas imposições de beleza. O que mais surpreende nisso tudo é que justo uma empresa de produtos de beleza, que muitas vezes é encarada como vilã, realizou uma pesquisa deste tipo e propôs uma campanha pela “real beleza”.


Que muitas têm o espelho, a balança e a tv como inimigos declarados todos nós sabemos, mas também temos consciência de que possuímos uma beleza toda especial. A beleza está nas“imperfeições” perfeitas (celulites, estrias, rugas) que todo mundo tem. O resto é photoshop, intervenções cirúrgicas, maquiagem... O resto é irreal, é falso...


Por isso que Bebe, minha cantora preferida, diz:


“E está cansada de jogar a toalha


E vai tirando pouco a pouco as teias de aranha


Não dormiu esta noite, mas não está cansada


Não se olhou em nenhum espelho, mas se sente tão bonita.


E colocou rímel nos cílios


Hoje gosta do seu sorriso


Não se sente uma estranha


Hoje sonha o que quer


Sem se preocupar com nada


Hoje sabe que sua vida nunca mais será um fracasso


Hoje vai descobrir que o mundo é só para você


Que ninguém pode te ferir, ninguém pode te ferir


Hoje vai compreender que o medo se pode romper com um simples não


Hoje vai rir porque seus olhos estão cansados deste pranto, deste pranto


Hoje vai conseguir rir até de você mesma e ver tudo o que você conseguiu”


(Ella, Pafuera Telarañas, Bebe)

Ao meu alter ego


Apesar de dizer que me odeia e que eu devo sair de sua vida, Marília fez uma espécie de poema para mim. Sim, queridos, agora sei que ela me ama!

Ao meu alter ego

Um dia olhei no espelho e vi uma mulher se afogando num mar de lágrimas, dor e mágoa. Entrei no espelho e segurei a mão da tal moça tentando tirá-la daquele mar de agonia. Peguei sua mão e levantei seu corpo. O maior esforço que já fizera na vida. Já não me importava com nada a não ser salvar a pobre moça. Quando seu rosto saiu da água, vi que a moça tomara minha forma. Tinha meu rosto, meu corpo, minha alma.

Ela, vendo minha surpresa, agarrou minha mão com força usando também a sua outra mão. Me afastei e relaxei a mão. Já não tinha a mesma vontade de salvá-la. Ela, percebendo isso, agarrou-se em meu braço e tentou se erguer. Não fiz nenhum esforço. Com o terror estampado no rosto que nunca havia visto antes, ela me implorou com os olhos cheios de lágrimas:
_ Salve-me! Você pode. Salve-me!

Quanto mais eu tirava minha mão da concha de dedos que ela tinha feito, mais ela me olhava, chorava e apertava minha mão. Gritava meu nome. Eu fingia não ouvir. Então, num só movimento, libertei minha mão da manopla que a aprisionava.

Ela soltou minha mão. Vi afundar lentamente. Vi o mar a engolir vorazmente, como um monstro de mil cabeças engole uma presa anêmica. Vi seu rosto afundar e a água penetrar sua boca e chegar a seus pulmões. Sim, vi seus pulmões. Vi as ondas dentro de seu corpo.

Debatia-se. E eu observava de perto sua agonia. Não senti nem dó nem remorso.

Quando sua mão começou a afundar, ouvi seu último suspiro. Fechei com força os olhos, dei as costas para o mar e parti.

Desde então, toda vez que olho no espelho, morre um pedaço de mim.

Marília Dalva